Alcoolismo e Drogadição na Adolescência
- saudepsicofisica

- 5 de out. de 2021
- 4 min de leitura
Os Transtornos Psíquicos, as Psicopatologias, são inúmeros e, com o tempo, foram sendo dissecadas pelas ciências. De um tempo em que a loucura (em que hoje agruparíamos diversos transtornos, como por exemplo, o borderline) era creditada a uma possessão demoníaca; um tempo que uma Distimia seria classificada como Taedium Vitae, ou seja, um tédio vital que poderia ser resultado do excesso do Humor Negro, produzido pelo baço, que levaria a um estado de prostração que poderia levar ao “homicídio de si mesmo”.
Era visto dessa forma na Idade Média e foi evoluindo a passos lentos até fins do séc. XIX, quando a psicologia, a neurologia, a psicanálise e mais adiante a psiquiatria, vão dar os primeiros passos. A ponto de hoje termos o DSM-V (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), da Associação Psiquiatra Americana e o CID-10 (Classificação Internacional de Doenças), da OMS.
Quanto as etiologias das psicopatologias, há uma gama de traumas, eventos vivenciados, distúrbios, fatores ambientais, sociais etc., há também a questão dos Transtornos Relacionados a Substâncias.
Quando se toca no assunto, logo as pessoas, de uma forma generalizada, pensam em substâncias ilícitas. Para afunilar o objetivo deste artigo, faz-se necessário restringir a dois elementos: álcool e jovens.
É ponto pacífico o fato de que a sociedade brasileira tem uma tolerância a essa droga a ponto de não a considerar como tal. O consumo associado à diversão, comemorações, festas e todo tipo de reunião informal é uma “praxe”quase inquestionável. E, sabemos que a porta de entrada para a adicção está bem próximo dos jovens, embora seja proibido vender ou fornecer, ainda que gratuitamente, bebidas alcoólicas a menores de 18 anos, como reza o Artigo 243 da Lei 8.069.
Em maio de 2019, a OMS lançou, durante a Assembleia Mundial de Saúde, uma atualização da classificação, a CID-11, que entrará em vigor em janeiro de 2022.
Com relação aos Transtornos Relacionados ao Uso de Álcool, novas categorias foram incluídas, como:
• Padrões de consumo nocivos: beber pesado episódico (BPE) — consumir grandes quantidades de destilados em curto espaço de tempo —, conhecido como Binge Drinking, associado a ocorrências de abuso sexual, sexo desprotegido, overdose, quedas e até tentativas de suicídio;
• Convulsões, com transtornos perceptivos e convulsões não especificadas;
• Delírio induzido por álcool;
• Transtorno psicótico induzido por álcool: alucinações, delírios, sintomas psicóticos mistos e não especificados.
Com relação ao uso do álcool por jovens no Brasil, há uma preocupação com estudantes entre 13 e 15 anos, especialmente as meninas. A média da primeira experiência é de 12,5 anos!!!Aumento de BPE entre mulheres, especialmente entre as jovens.
De acordo com a OMS, os brasileiros com mais de 15 anos beberam 8,9 litros de etanol per capta em 2018. Bem mais que a média mundial: 6,4.
Como se sabe, as áreas do córtex pré-frontal é a que mais leva tempo para se desenvolver no ser humano e, quanto mais cedo a iniciação no alcoolismo, maior a inibição do desenvolvimento dessa área cerebral, responsável pelas Funções Executivas relacionadas a “processos cognitivos de estabelecimento de metas, planejamento, solução de problemas, fluência, categorização, memória operacional, monitoração da aprendizagem e da atenção, flexibilidade cognitiva, capacidade de abstração, autor-regulação, julgamento, tomada de decisão, foco e sustentação da atenção”.
Ou seja, os danos neurológicos estão ligados diretamente à questões comportamentais que, com toda certeza, vão implicar em uma dificuldade de inserção social. O desenvolvimento da adicção pode levar a problemas de transtornos persistentes de amnésia (Síndrome de Korsakoff), despertar vários tipos de depressão, sentimento constante de culpa, vergonha, afastamento da família, dos amigos, isolamento social praticamente total e até mesmo ao suicídio. Entre as motivações que levam os jovens atualmente a buscar as bebidas alcoólicas podemos citar, principalmente:
• Comportamento de assumir riscos e testar limites (típico dos adolescentes), que pode incluir o consumo de álcool;
• Pressão social e aceitação pelo grupo de amigos, que influencia expectativas sobre os efeitos do álcool. O exemplo dos pais e familiares também é influenciador;
• Percepção equivocada, de que é normal e aceitável beber com frequência e em quantidades exageradas.
Entre universitários brasileiros, quase 90% já beberam ao menos uma vez na vida, 54% experimentaram antes dos 16 anos.
O que mais espanta é a complacência dos pais com relação ao abuso do álcool na adolescência: é comum o/a jovem entrar em estado de coma em uma festa ou churrasco de cursinho pré-vestibular, por exemplo, e ser “rebocado” até sua residência sob riso dos colegas e ao acordar sofrer o deboche dos pais e dos mais velhos. Como se fosse uma espécie de rito de passagem. Muitas vezes tendo de ser “resgatado” pelos pais numa UBS, conectado a uma bolsa de soro fisiológico.
Por outro lado, acontece de um dos pais encontrar um baseado nas coisas do/da jovem. Está instalada uma operação de guerra, que vai do “onde foi que erramos?”, passando pelos responsáveis da escola, os questionamentos de “quem deu isso para o meu filho?” (o filho é sempre a vítima de outro aluno mal intencionado), uma busca por psicólogos, psiquiatras, psicanalistas. O que geralmente eleva o nível de revolta juvenil, retroalimentando o desespero parental, criando um ciclo disfuncional por conceitos/pré-conceitos do senso comum.
O problema do álcool entre jovens não é de hoje, mas vem crescendo e se misturando a outras psicopatologias pré-existentes e advindas do uso indiscriminado e ignorado pela sociedade.
Um assunto pouco abordado, mesmo nos meios da saúde mental.
Maria Lúcia Pesce
Psicóloga Clinica
@psicologa.marialuciapesce
.
.
.




Comentários